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5 poemas de Ricardo Escudeiro

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Ilustração: Francinaldo Brandão



fubeca

queria
um presente
qualquer dia
um olho
inerte e alheio
vidro
que nem vê
e nem sente
que fixo despresencia
a depredação do tempo

egoísmo

encher um pote com esses olhinhos



concha

memória ganhada em um presente de Bárbara Manaia

caixa
lar
abrigo
lugar
pensa em levar
hesita
acha injusto pegar
casa
de bichinho

ali daqui
deixada na areia
parece uma orelha
essa que é
pra quem sabe
telefoninho
de ouvir voz de mar



pichação para muro de lamentações

lamentação

em oração
prostrar se
diante daquilo que quer se
e não pode ter se

lamentável

ter muros por todos os lados



coleção outono inverno

alta costura descosendo vidas
desfila pontos que não são pra nós
aqui embaixo
só gentes miúdas
costurando trapos às escondidas



a cada seis de janeiro

para Nathaly Hanemann


tento desenhar um lugar
aquele de estrelas pra vidas inteiras
aquele da inconstante finitude do sempre
nem sei desenhar mas tento

não bastasse esse não saber
há essa tinta que me escorre
da caneta como memória
como puxada das entranhas

e algumas lembranças
a gente não consegue segurar sem tremer a mão

aí me sai esse pouco
talvez segundos talvez mundos
de existência mais viva
nesse lugar esboçado nesse desenho
nesse canto
tremido

quão ruim é não saber desenhar

daí a gente fica assim
contemplando lugares inexistentes

e neles a salvo
da miséria que é só existir

a cada seis de janeiro




Ricardo Escudeironasceu em Santo André-SP, em 1984, onde vive. É autor do livro de poemas tempo espaço re tratos (Editora Patuá, 2014). Graduado em Letras na USP e ensaia já há algum tempo um mestrado em literatura portuguesa, acerca da obra de Saramago. Leciona e aprende no ensino fundamental II e no ensino médio. Em 2013 juntou-se ao Coletivo Tantas Letras, de São Bernardo do Campo, onde publica poemas no Zine Lapada Poética.





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