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4 poemas de Wander Porto

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SOPRO DA MADRUGADA

Catar plumas
No sopro da madrugada
É como referir-me ao tempo
Sem dizer nada.

E falar de você?

Nas lágrimas de sêmen
Que salpicam as calçadas
Vão ficando
Uns espelhos de saudade,
Umas antigas vontades
De ainda ter
Um lar,
Um bar,
Um par
E um dar sem conta
De coxas que se entrelaçam
Em carícias últimas,
Às quais não me dei franquia
Por medo de me acordar
Assim tão moço
E ainda tão cedo
Em susto e taquicardia.

Mas teu cheiro está
Nas plumas que cato
No sopro das madrugadas,
Perfilado,
Militar
E só.





POEMA DE PLANTÃO

A manhã entrou
Abandonada de sol,
Sonegada de pássaros
E cancelada de azuis;

A tarde chegou
Atropelada por sons,
Rubricada de pêsames
E sufocada de adeus;

A noite passou
Apavorada de bangs,
Povoada de céticos
E lambuzada de berros.

Quem viu minha alma
Que aqui chegou sorrindo?
Quem viu meu espanto
Que um dia quis o mundo?

A madrugada lamentou
Na sirene do camburão
Que levou a jovem morta,
Estrangulada de solidão.

Encerro o ponto
E pego o ônibus
Incendiado de medos,
Apedrejado de sonhos!






CORES DA NOITE

Uma poesia incerta
Vara o sinal
Vira a esquina
Com a sirena aberta

Como uma ambulância verde
Levando um ferido de amor,

Talvez um cavaleiro de azul
Clamando por glórias perdidas,

Quem sabe um pintor andaluz
Uivando negras tintas ao luar,

Quiçá uma rádio-patrulha cinzenta
Carreando roxas dores vadias

Ou ainda uma branca mulher nua
Chorando por se sentir tão pouca.

Uma poesia incerta
Varando o sinal
Virando a esquina
Com a sirene aberta

Quase sempre nada mais é
Que uma palavra nunca dita
Arrombando o vermelho da boca.







LIVRO CAIXA

Há pressupostos
Proclamando deuses,
Há desconexos
Incendiando os ares,
Há uma estilha de luz
Caída numa sarjeta bêbada,
Há um cálice de paz
Vomitando vermelhos pelo ânus,
Há um triste cadáver
Declamando cadernos de poemas,
Há um imenso afeto
Embalando êxtases de solidão,
Há um imortal desejo
Rompendo os códigos da vida,
Há uma demência no ar
Vendendo silêncio aos sonhos,
Há um espocar de fogos
Celebrando a arte dos estafilococos,
Há um amargo nas bocas
Cumprindo o fadário das tragédias,
Há um coração sem efeitos
Acendendo círios no próprio túmulo,
Há um vigário sem orações
Na catedral dos incomunicáveis.

Há, por certo há,
Um Dever no livro Razão,
Um Haver na folha Delírio,
E um Saldo na coluna Tempo
Grafados em letras de nuvens:

-Um instante para nos amarmos!

Assim por dentro como por fora,
Assim na Terra como nos Homens!

Poemas e Ilustrações : Wander Porto


 
Wander Porto nasceu a 14 de Maio de 1950, em Patos de Minas, Montanhas Gerais. Começou na juventude escrevendo pequenos poemas de encanto, canções de maldizer, letras de música e alguns artigos nos jornais da cidade. No início dos 70, com amigos, editou o jornal A BENÇÃO que durou pouco, apenas o bastante para ser inoculado pelo vírus letal das Letras. Tem dois livros publicados e esgotados, - MUITO PRAZER! – TODO MEU!- contos ligeiros e -SOPRO DA MADRUGADA- de poemas. Na gaveta sem chaves, ALMANARQUIA – Contos – e SUMIÇO – ARQUITETURA DE UMA SOLIDÃO – Romance Ficcional. Hoje, sua principal ocupação é anunciar que está chegando para a Humanidade a IMENSA MANHÃ DOS IGUAIS e, num triz, a HARMONIA se instalará na Terra quando todos estarão NUS, belos e nus, portanto, permanentemente, legíveis uns aos outros. Assim, não haverá mais questionamentos inúteis pra nos encher o saco, embrutecer a paciência e instalar Cizânias!!!

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