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07 poemas de Camila Nuñez Muitas

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Ela nada

Regressar de ti para si
Não deixando rastro, nenhuma evidência.
Ela é tão misteriosa para você quanto para ela mesma
Andando sobre paredes, na casa, sem pertencimento algum.
Seus pés beijam o vento
Sopros flutuantes arrastam pensamentos
Pegadas apagadas
Ausência de nada
Anda suspensa de ti como um corpo em desdobramento
Avista tudo de longe
De baixo, de cima
Nada de dentro
Mar dentro da nau, regresso.
Netuno, deus do absurdo.
Sim , o oceano não passa de um louco
Descobre que é  dentro dela que mora a morte
Ela por dentro é mar
Deseja não se afogar


Nada


Sincronicamente move pernas e braços
Anseia por abraços que asfixiem o desparecimento
Sufoca a despedida
Chora, implora
No ar um cheiro de fim tão forte quanto iodo
Há um  insuportável perecimento preenchendo seu olfato
Desejo de não respirar
Ela só quer mergulhar
Na imensidão desconhecida
Ela
Nada


Na Pele

Vivo esse louco arroubo
 Intrínseco e  metafísico
Imagino-me altiva a vagar
 Num ardil
Vacilar  sempre.
Sequer sei falar sobre certas coisas que me distraem
Oscilo entre sublimações, ostracismos, delírios  e castrações
Ser objetiva é paradoxal demais para uma mulher atormentada pela subjetividade
Ser  indomável
Sua oferta me é ofensiva                          
Tão pouco  me basta
Não roubarás os suspiros que só eu devo sufocar
É certo que  mente
Talvez sem saber
Não sabemos medir polaridades,
Amar é estar vivo e engloba  a dúvida
A asfixia, a pausa, a apneia.
O mar também é incerto
Há sempre riscos, em tudo, no raso  e num profundo mergulho.
Lá,
No fundo há sempre calmaria
Preciso romper a superfície e penetrar no abissal
de mim
Uma indolência me perfuma
 Perfurando meu entusiasmo
Essa onda
Sou pedra

Não acredito que será sempre assim
Conheço a temporalidade
A eternidade quem cria é o legado
Peço que isso não me seja negado
 E que alguém...
Que alguém me leia
Pareço sucumbir à fragilidade
Mas é só uma ilusão
Ou alusão
Minha
Sua
Procuro
Mas o que  busco  não pode ser uma tábua de salvação
Não acredito mais nisso
Vivo entre o mergulhar  e a correnteza
Vivo tesa
 Mesmo quando morna
Espero por uma beira
Onde bata sol e eu possa sentir o frisson das borbulhas das águas mordiscarem meu corpo até eu achar graça
...
 A Graça alcançada
Quero !
da beira enxergar a garça
 Branca do outro lado, em cima de uma eira de sal
Mirando o peixe
Quero assistir  seu lance perfeito
Tão faceira ave
Tão certeira se faz na necessidade
da fome, da carne!
 É belo,  não trágico.

Quero tomar dessa água salobra e conseguir extrair todo o doce que sei que ela tem
Serei eu
 O preamar
 E a pororoca


Meu voo tem destino
 Ou não?
 Existe também o desatino
 Sempre constato que são fatos
O perene anda ao lado do perecer
O desatar deve ser tão preciso quanto é  preciso respirar
O desafio  é o limite que minha angustia pode suportar
Meu suicídio se dá no momento exato de renascer
E quando isso
Cerrarei meus olhos para você
E jamais olharei para traz
Não com os olhos de outrora
Porque somos sempre coisas
novas

Luas cheias e vazias
Ambas são lindas
Encanta-me ver um macho grávido
Sou de sagitário
Metade  cavalo
Os cavalos-marinhos apresentam um elaborado comportamento de corte.
 Nadam juntos e enlaçam suas caudas.
 Através das contrações musculares do macho, ele abre seu orifício.
 Abrir orifícios é sempre um ato de coragem     
 É na verdade selvagem!
 Na metáfora eu sigo
Não se afete, falo para mim mesma.
 Eu  também sou  ela
Apenas siga,
 Ouça
falo?
Ouço
 Ela, diga!
O que a vida te  pede ?
A vida  me  impele
Sinto toda a minha vida
na pele.

Por do sol

É como se ficasse um vão entre o dia e a noite
O abismo lírico
A poética do hiato
Uma Lacuna estratigráfica
Como um  tom  de cinza
Que está entre o preto e o branco
Como a cinza
Que é a própria desmaterialização de algo que se desfaz
O próprio resto em si
É algo assim
Entre o tudo e o nada
O horizonte parece desfalecer
É tão lindo que assusta
E me enche de angustia
É como ficar no entre
Entre a matéria e o espírito
É como estar apaixonada
Aquela sensação desencaixada de tão encasada
Paradoxal
É um não pertencer de tão profundo pertencimento
É perecimento
Há um todo que não se vê e não tem fim
Por isso não se alcança
É como um consciente sonhar e se sentir no meio , perdida
Entre sonho e vigília
É estranho o por do sol

É por
É por vir
É por ir
É por algo...

É cor de cobre
De extração
Impregnado de extensão 
Que escapa, que esvai 
 bem na sua frente
A olho nu
Como um deus
Se despedindo
e o que nos cabe
é  apenas
Contemplar!




Outono

Observo o horizonte
Suspirando em falsete
Meu olhar se faz oblíquo
Com os sentidos transversais
Observo quase cega
Mas ainda tenho faro
Distraída pela impermanência efêmera 
De um céu em metamorfose
Implodindo cores
Surreais
Fendas de luzes se abrem
Uma linda nau em nuvem se forma
E o céu se colore em tons quentes 
Num instante cai o sol
A nau some
As nuvens se espalham em cartela cinza
E eu
Me horizontalizo
Em prece
Oh! Outono, de fria brisa
Paradoxos
Linhas oblíquas
Seu céu me abduz 
Acho lindo os urubus
Com seus olhos rapineiros
Farejando  carniças
Eu também 
Com meus olhos
Sinto cheiros
De outonos 
inteiros




Além da pele

As vezes eu me perco e vago
E o chão se abre para um vasto e complexo desentendimento
Me sinto frágil e quebradiça
São bilhões de pedaços
Um caleidoscópio alucinógeno
Uma miragem nebulosa
 surreal
O caminho perde o sentido
A bússola para
 pairo diante de um enorme não sei
Arrebol, por do sol, eclipse
Tanto faz
Procuro por nós, encontro distâncias
Léguas homéricas 
ainda serão percorridas
E uma vontade latente por trégua, por água...
Ela sou eu em algum lugar 
Em trânsito 
Em transe
Transo palavras como quem busca saída
mas a vida é labiríntica 
A existência é frágil
A certeza oscila
As verdades são ilusórias
E a realidade cobra
 troco de pele e isso dói
A coragem é constituída por substancias corrosivas e explosivas 
Que venha a Implosão então
Em texto
Em vida
Em gritos
 silencio.
Me reencontro...
Precária
Existir de fato é poético e 
Hermeticamente delicado.

Sou eu 
Apenas mais uma
Bela circunvagante existência
Por excelência e servidão a condição humana. 
Um jogo
Um troco
Um troço
108 é o número de cantos e contas sagradas
E eu não faço ideia da quantidades de vezes que ainda irei me perder
O yoga é vai e vem 
Krishna aconselha Arjuna a lutar
Não existe paz sem guerra
Os oposto coexistem
As escrituras pedem para eu ignorar meus sentidos e a racionalização
E eu giro...
Grito e cio
Silêncio
Sou boa e má
Exalo fedores e odores

É bela e vertiginosa a impermanencia das coisas
Beijo o chão e todos os pés e mãos de Shiva
Em suas 84 mil posturas
Seu falo imenso 
seu tridente em punho
E sua dança 
Sou uma de suas serpentes circundando seu pescoço
E troco de pele, e troco de pele , e troco de pele...



Rara

Que holocausto é esse?
A ambiguidade deve permanecer ou ser eliminada?
O que tem de ardiloso e perverso nessa fidelidade ao caminho do nada
  Minhas dúvidas,   também posso chamar de verdades
Será “certo” manter-me fiel a escolhas de outrora
Como ser predador sem ser presa?
Toda hora ou milésimo de segundo vivido já é outra  hora
Avante , eu e  minhas perguntas sem respostas
Elas se sustentam num presente / futuro que flutua sem ponto de gravidade
Não se sustenta imóvel!
Será isso grave, será uma síndrome, tem remédio que justifique castrar o desejo pelo desconhecido? Ou será que conheço bem tudo isso?
O porvir misterioso ... sigo, ou sou arrastada por algo que pulsa, e não sei dar nome
Assim, posso também esquecer meu nome ?
Aonde chegarei, e que valia tem minha trajetória, se não para mim mesma ?
A lucidez tange a loucura e o contrario também, e como julga-las se não matando a singularidade?
Deixa pra lá
Minha primeira pergunta era...
Que holocausto é esse?
Eu sou uma legião em extermínio diário
Atravesso o seco deserto, com a secura de um coito roubado.
Afundo em águas, terras uterinas, ensopadas.
Eloquência nenhuma, tem hora que o grito é mudo!



Aferindo toda a minha animalidade
 Qual é a maquina? O osciloscópio que mede a verdade de um desejo ou uma paixão ?
Meus muitos suicídios
Saiam da frente!
Quem me explica o triangulo das bermudas?
Eu uso saia
Entre minhas pernas
Goteja uma água
Dita sagrada
É inexplicável
E cai em cima da virgem
E isso também não se explica
É sagrado
 Eu sou gruta!
E os prazeres dos olhos?
Ninguém vê como eu vejo!
Não exatamente...
Existir não é exato
Por favor, saia da minha frente.
Fica por traz
O retrovisor tem algo que me encanta
Talvez porque através dele eu veja o que está na minha frente
E também o que está por traz
Há sempre algo por traz!
Tem gente falando comigo e eu não consigo escutar
Ruminar ensurdece?
Será que as vacas escutam enquanto se distraem em mastigações?
Será que gozam com isso?
Quem vai me responder com exatidão
E porque devo acreditar?
Quem ousará desdizer uma poética?
Sim
A poética engloba a vida
E a vida
Nos engole
Rumina
E cospe!
Rumine o que é seu
E devolva o que sobrar
Essa massa homogênea
 substancias que dão barato
É cara, é rara!





Odor

De prontidão ela se arruma para uma noite que não vai chegar.
Seu olhar anda tão desencaixado que parece vestir-se pela primeira vez de uma lente multifocal
Com isso produz vertiginosos  pensamentos
Inclina a cabeça e olha para o céu azul de nuvens brancas
Projeta-se nelas
Nas nuvens
Ele a chamava de nuvem
Ela deseja um dilúvio negro
Que venha encharcá-la
Isso não acontecerá
De súbito
Sente o odor da carniça
Do fim.



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