.jpg)
CABEÇA DE SOL EM CIMA DE TREM
Uma das melhores coisas quando se vai escrever a respeito de algo que se relaciona a arte é saber que se deparou com algo que é novo ou que ao menos o surpreende pela qualidade. Cabeça de sol em cima de trem, com textos de Thiago E. e sonorizado por Jan Pablo, atinge em cheio as duas expectativas. Não sei se dei ouvidos ao amante de música que sou ou ao literato, mas pude experimentar que assim como estes dois aspectos convergem na minha apreciação, também a palavra e a música ressonam em harmonia na obra de Thiago E. e Jan Pablo.
Audiolivro, álbum musical, são rótulos que não devemos usar logo de cara quando mergulhamos na fruição da obra de Thiago E. Na verdade, o primeiro movimento deve ser indubitavelmente de mergulhar na obra. Com direito a orelha e um posfácio por Jorge Mautner, também desta forma Cabeça de sol em cima de trem, desafia rótulos que não comportam seu aspecto plural.
O resgate da palavra lida simplesmente, sem rodeios, sem camuflagens empoladas de interpretação e principalmente sem ser destituída de sua força motriz de fonema pela ora trilha sonora, ora sonoplastia, cativa imediatamente o leitor. Este por sua vez, ouve com ouvidos musicais os poemas diante do cenário melódico dos instrumentos, aguardando a próxima faixa como o próximo hit no dial. A voz não é um outro instrumento em Cabeça de sol em cima de trem, ela carrega apenas anseios de palavra lida e jamais de canção. Dessa maneira Thiago E. está comprometido com o texto, que é o foco principal, a locomotiva do trem.
Mesmo trazendo uma pitada de narração, como no caso de Manoel, em “Chofrer” [faixa 2] e indo ao experimentalismo de destituir palavras de suas classes gramaticais, como em “Todos Dizem Eu Te Amo”, Thiago E. encontra soluções sonoras em assonâncias para manter fluido o seu texto. Seus versos livres encontram Drummond na característica mais leve e cotidiana de sua escolha de palavras, de modo que citar C.D.A. acrescenta ao panorama lírico que é buscado em Cabeça de sol em cima de trem.
Ainda que a sutileza do lirismo pareça perder-se em “Vruum”, que acaba por remeter a alguma performance jazzística dos idos dos anos 60, de forma alguma a unidade de Cabeça de sol em cima de trem, parece ter sua integridade de obra comprometida. Como qualquer livro ou álbum que amamos tem seus pontos altos e baixos, mas, no duro você não quer abdicar de nenhuma faixa em prol da perfeição estéril. Não corte nada, há quem chame de lado B, dane-se. A verdade é que não vive de compactos, você quer Cabeça de sol em cima de trem na íntegra, long play.
OUÇA FAIXAS DO CD CLICANDO AQUI!
poemas de Thiago E foram publicados aqui!
Fotos: Maurício Pokemon
* * *
Roberto Dutra Jr. é um neurótico social como todo brasileiro de cidade grande. Adora literatura, mas as palavras não fazem mais sentido. Mestre em Letras, tem um livro publicado e diversos artigos de caráter acadêmico e crítico publicados. Foi editor de revista acadêmica, contribuiu para jornais e revistas literárias no Rio de Janeiro e tem um seríssimo flerte com a música. Adora gatos e poemas, que movem-se na penumbra e nunca revelam-se inteiramente. Leia mais textos do autor aqui.
Thiago E. Poeta de Testes. Relator de Processo. Músico e Compositor. Autor do livro Cabeça de Sol em Cima do Trem (com imagens de Joniel Veras). Integra a banda Validuaté, com a qual lançou os discos Pelos Pátios Partidos em Festa (2007), Alegria Girar (2009) e o EP Este Lado Para Cima (2013). É co-editor da Revista Acrobata : literatura audiovisual e outros desequilíbrios. Trabalha no CEAF do Ministério Público do Estado do Piauí. Com o grupo Academia Onírica, editou a Revista AO (2010 a 2012). Edita a coluna Intacta Retina, no Jornal O DIA, aos domingos, publicando poesia, prosa, artes plásticas, de diversos artistas. Em parceria com Jan Pablo, produziu o álbum "Cabeça de Sol em Cima do Trem" (2013).
Jan Pablo. Economista. Músico desde os 15 anos, sendo autodidata. Tem atuado como integrante de grupos representativos no cenário piauiense. Em 2010, lançou um primeiro EP com o projeto "Canis Vulgaris", sendo este realizado entre as cidades de Goiânia e Teresina. Em 2011 lançou dois EPs, sendo o primeiro pelo grupo Trinco e o segundo pelo projeto Guardia Nova. Ambos EPs tiveram importante papel dentro da produção musical na cultura teresinense. Em 2013, com o projeto Guardia Nova, lança o primeiro LP, sendo totalmente produzido em um home estúdio, com capital próprio. Este projeto teve, na sua maior parte, instrumentos gravados e programados por ele mesmo, junto a isso o trabalho de gravação, produção, mixagem e masterização. Tal LP pôde alcançar o cenário alternativo musical nacional, onde o grupo passou a frequentar coletâneas e sites especializados, junto a grandes nomes no cenário musical atual. Ainda em 2013, lança mais um EP com o projeto Guardia nova. Com o poeta Thiago E, coproduziu o álbum "Cabeça de Sol em Cima do Trem", responsável pela composição da trilha sonora, produção, mixagem e masterização.