Luís Costa
CUSPIU nos rostos dos vendilhões dos templos,
deu pontapés nas mesas, libertou as aves
e, todo nu, correu através dos campos,
correu, correu, correu, até que os seus braços
se transformaram em negras asas – agora
alimenta-se das feridas mais fundas, no excesso da luz.
TRABALHA-SE no poema
com a precisão das lâminas e dos martelos
renova-se ou destrói-se
sob a contenção da ira
( desalmadamente
acendem-se as mãos
há um excesso de luz no cérebro do poeta )
MOVIMENTAM -SE entre
o sacerdotal e a febre da contenção
nas periferias
próximos da lúcida loucura.
MORAM nas profundezas abissais
mas quando se expõem à luz
fazem lembrar cabeças de anjos / degoladas
por onde se pode ouvir todo o cântico do mundo.
ENTERRAM as mãos no barro
moldando - o com uma violência benevolente
como o último relincho menstrual
das velhas mães / flutuantes /
no império dos espelhos quebrados.
ABRO as janelas. aprendo a ver
através do excesso da luz.
as pegadas dos animais nocturnos
indicam-me o caminho.
esta é uma alta condição. estou salvo!
Fotografia da poeta Isabel Mendes Ferreira