Três estudos para passarinho.
I.
Problema Oblíquo
Tenho um pássaro nas mãos
O que fazer,
Soltá-lo e perdê-lo
Ou guardá-lo e perdê-lo?
II.
Solta um passarinho e voa torto
Mas aprende e acha pouso
Voar é profundeza de passarinho.
III.
Uma vez me vi mamão
Foi quando criei a conjugação do verbo
Na primeira pessoa:
Eu sanhaço.
* * *
Sei de canários, sanhaços e coleiros
Torturados em gaiolas de bar
Também eles perderam,
Os pequenos bêbados.
De que sentem falta,
Do voo, do pouso, de amar?
Eu também sou um deles,
Pendurado em mesa de bar
De que sinto falta,
Do voo, do pouso, de amar?
* * *
Um pardal está só
O céu está cinza
Pardal e céu se confundem num só
O pardal está cinza
E o céu está só.
* * *
Rimbaud dos campos
O homem sossega um pouco a enxada
Apoia o queixo sobre as mãos entrelaçadas ao cabo
Este homem permanecerá
Os pés do homem pisam a lâmina
E balançam o aço de um lado para o outro
Este homem sabe a lâmina quebrando o capim
Ao se recolher no sono da noite, ainda ouve o êxtase surdo da raiz partida
E do torrão arrancado da terra
Sabe o homem que o capim retornará a tudo
E crescerá sobre todas as coisas
O amor só conhece aquele que oblitera
O homem pensa que araras são palíndromos com asas
* * *
Existe a vergonha da carta no poeta
Essa coisa de não ser violado
O poeta escreve para nunca ser lido
Autor anônimo é a redenção do erro do mundo
Livros ficam bem se empoeirados
Fazem coçar o nariz,
A verdadeira função da poesia.
* * *
Meio-dia a palavra paralelepípedo
Queimava meus pés.
Desde então, nenhuma outra me mete medo
Só nomes próprios.
Foto: origami de raio-x de Takayuki Hori
* * *
Marcelo Benini nasceu no ano de 1970, em Cataguases/MG. Aos quatro anos, mudou-se para Brasília, onde reside ainda hoje. É autor dos livros O capim sobre o coleiro, de poesia (Edição do Autor, 2010) e O homem interdito (São Paulo: Intermeios, 2012). Email.