(Pintura: Symphony in Green and Gold, por Thomas Dewing)
A NOITE TRISTE
O incensário do céu me elevou, um dia,
À noite triste, à noite, enfim, que não existe.
Que imenso jardim de antiga alegria
Esperava-me ali, abandonado e triste.
Esperava-me, sim, abandonado e triste,
Porque de lá partira, um dia, sem perceber,
O meu mais belo sonho que já não existe...
E eu pude ver, então, o luar se estender
Sobre o jardim daquela noite triste
Como uma floração do que não há de ser...
E assim, na messe angélica, na messe carmim
Que de uma pálida saudade consiste,
Pude ver nascer, lentamente, em mim,
O luar que banhava a noite triste…
-
Ó tu, que tão longe estás,
Como uma nuvem calma
Que sonha na escuridão da noite,
Tu, como o último rastro de luz
Que se fita no poente do horizonte,
Olha a estrada percorrida e vê,
Não importa quão longe estejas,
Como a minha alma,
A cada segundo que tomba,
Deixa um tanto de mim
Pelo caminho que rondas...
E vê bem que o nosso sonho ainda,
No céu turvo, no fulgor carmim,
Ou na estrela que te afaga o olhar,
Que o nosso sonho ainda fulgura
Somente para que tu, que tão longe estás,
Ainda possas me encontrar.
-
Vivo os meus dias voltado
À grandeza do que outrora
Vivi e que, a cada hora,
Qual velho céu naufragado,
Mais distante do agora,
Crepuscularizado,
Afasta-se do meu fado
E do fim que não demora.
E que solidão parece
Sugar a minha alma,
Com os lábios de prece,
Se o meu outrora ponho,
Nostálgico e sem calma,
Na fonte augural do Sonho!