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Quatro novos poemas de Jorge Lucio de Campos

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Hourglass (s/d), Anatoly Baratynsky.



Pequena réplica à cegueira

a José Saramago

1

A melhor cegueira é a negra.

2            

Nenhum dos olhos é obrigação, mas dádiva.

3            

Porém, só se o valoriza se não há.

4            

A pior cegueira é a branca.

In: A grande noite perdida (Bookess, 2018).







O primeiro poema

a Manoel Bandeira

Coisas que eu pedi ao meu primeiro poema:
que me avisasse tão logo soubesse o seu próprio segredo,
que resplandecesse num dia inteiro de calmaria,
que fosse paciente e esperasse a hora certa pra inquietar,
e que, toda vez que um cisco caísse no olho da realidade,
primeiro o dissesse e depois o apagasse num gesto de linha.


In: A grande noite perdida (Bookess, 2018).







Ampulheta

sou
o
que
so-
bra
de
mim
e
o
po-
e-
ma
o
que
sal-
va
do
mun-
do

In: A grande noite perdida (Bookess, 2018).







Chapeuzinho vermelho

É dentro
de nós
que vive
a fera

Por mais que
queiramos
fugir dela

Por mais que
tentemos
ir embora

A fera sabe
a hora −
a fera não
espera

In: A grande noite perdida (Bookess, 2018).







____________________
Jorge Lucio de Campos é poeta, ensaísta e professor da ESDI/UERJ. Publicou os ensaios Do simbólico ao virtual (1990), A vertigem da maneira (2002), A travessia difícil (2015), Lembretes filosóficos para jovens sábios (2017), O império do escárnio (2017) e as coletâneas Arcangelo (1991), Speculum (1993), Belveder (1994), A dor da linguagem (1996), À maneira negra (1997), Prática do azul (2009), Os nomes nômades (2014), Sob a lâmpada de quartzo (2014), Paisagem bárbara (2014), Através (2017), Véspera do rosto (2017), O triunfo dos dias (2018) e A grande noite perdida (2018).



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