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6 POEMAS DE ADES NASCIMENTO

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Jane Kenyon
Fuga da realidade


Primeira visão: raios de luz
Amanhece
: o sol

Visão do meio: muita luz
estômago cheio
: a sesta

Visão seguinte: outras luzes
escuridão povoada
: a festa.
 

Garagem em Curitiba


O outro lado da bicicleta
bem ao meu lado –

1001 possibilidades
de ela me levar

- São Paulo, vou hoje
à noite, sem ela.

Cobri-la com um lençol?
Prendê-la ao pé da estante?

Descer do metrô na república,
pelas ruas, e se perder

até o retorno à casa
de minhas amadas.

- São Paulo, vou hoje!
A noite sem ela.

Meu pai

Meu pai, um caboclo,
antes do seu almoço,
lavava bem as mãos,
os braços, o rosto,
e o belo pescoço.
Espremia limão no copo
com cachaça de meses,
dava um trago, almoçava.
Com toda a família,
a maioria das vezes.

Parada

Parar o tempo por um tempo que seja
Antes que o tarde seja tarde demais
Ao recusar a perda, quem esbraveja
Com a maré baixa, vida parada no cais.

Quando o sol quente abre o dia para o mar
Acorda o silêncio de tantas noites em mim.
Sem medo, silencioso, descanso meu olhar
Sobre reflexos prateados das águas sem fim.

Um breve mergulho que dera pelo universo
Já sem graça, por causa de tua ausência,
Causa-me espanto... este vazio relutante

“Astros pálidos” de uma canção distante
Mesmo tempo, rastros de uma existência,
Retorno ao mar. Cedo ao desejo submerso.

Repouso

Palavra que te quero
sorte!
Errou a palavra
falta ou norte.
No acerto,
oh, palavra abençoada!
Prêmio: a pessoa amada.
melhor brincadeira -
caça palavras.
Escondidas,
uma saía a outra estava.
Lá pelas tantas
um bando de três
palavras, palavras, palavras...
mergulho no rio
bem no revés.
Na sala
horizontal palavra corpo
tranquilo, silencioso, em repouso.

Virtuosa

 A força do sentido extremo
está naquilo que sustento.
No olho do furacão – o vento.
Na pupila de um cão sarnento.

Na leveza da alma – o beijo.
Na substância vertiginosa – a noite,
quando brilha, magistral – a lua
cheia, apaixonante, úmida.

Onde sol nenhum fulgura.
No fio da navalha – o sangue
do pacto – os amantes.

Na busca – o desaparecimento.
Na descoberta – a fuga
em qualquer momento.

Estes poemas estão no livro "Chave do verso" (Medusa, 2017). 



Ades Nascimento é professor, licenciado em Letras pela Universidade Federal do Paraná (UFPR)
e pós-graduado em Educação pelo Centro Universitário Campos de Andrade (Uniandrade), em
Curitiba/PR. Seus primeiros poemas foram publicados no III Concurso de Poesia Helena Kolody – Os poetas:
Antologia de poetas Contemporâneos do Paraná (Secretaria de Estado da Cultura, 1991). Paranaense,
nascido em 1963, vive em Curitiba desde a infância. Plantador de araucárias, cancionista, recebeu prêmio
de melhor canção (Bandeira II) no 5º festival da Canção da UFPR (1999), com a banda Nefelibatas.


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