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Laura Williams |
violência prevista
atacar o nervo
ótico mirar
os dois redondinhos
lindos da sua cara
fazer força para
entrar
tanta palavra
inútil, tanta
vista cansada
este encontro
fortuito a mais
não há de nos
fazer mal
pão e circo
lá fora o sol
arde
banhistas
se afogam
mini putas
pedintes
ralam
espremem a fruta
até o bagaço
turista atônita
não menti
não tenho
trocado
não guardo
pães e biscoitos
no armário
o que está
em jogo
a minha
a sua
dignidade
em trapos
lançados
como fera e cristão
neste asfalto
duelos onde espadas são palavras
conversas típicas de um covarde
(onanistaproxenetapederasta)
para aqueles que oferecem a outra face
enquanto jantam perversidades
o frio na espinha aponta para o corpo
uma pistola catártica
épica
capitão, como se ativam
nossos escudos defletores,
perdi as instruções
ou a aula, e agora estamos
sob ataque
inclemente das facções,
capitão, não respeitam
nem a sua farda,
menos ainda
sua galhardia,
riem cariados,
empunham
máquinas
e rebolam
sobre
escombros
deste museu
remoto da
humanidade
para fazer uma reflexão totalmente devastadora e sofisticada
não minta ou sinta
incorpore tudo o que existe
no mundo com singular
verdade, fume artefatos
culturais antigos, mas
não trague, traga
exemplos que funcionem
como espelhos escolha
as influências declaradas
e totalmente de propósito
omita
dois ou três pecados
que alimentem
com parcimônia
o mal dito
o gênio se esgota
em duas frases
fica tateando o
ar em busca
dos acordes
emudece
velho
de seus anos
os becos
que visita nas férias
são os mesmos
que habitamos
vacuovoidpoem
você reconhece aqui
a algazarra de silêncios,
as palavras brancas
cruzadas
quenunca deveríamos usar?
nossa gramática inversa -
metros mancos,
rimas encardidas,
sampler de ritmos
o vocabulário
que nos trai
quanta displicência
séria
quando o assunto é
sermos contemporâneos
farmacologia
compre sua dose
de doença
(imune à overdose)
Para ter a descarga elétrica
o transtorno psiquiátrico
a emoção incontrolável necessária
a cada poema
numa estação ou varanda,
em alguma cama
me espera
olhos tão cegos
que vamos mapear
o entorno pelo tato
boca tão seca
que reverteremos
drenos e ralos
gesto tão mudo
que bloquearemos o canto
de carros e aves
para ouvir o que rasga
um abismo entre
o sussurro
e o
silêncio
notícia desentranhada de um poema contemporâneo
ressuscitada após o afogamento em uma banheira
ocorrido no exato minuto em que regurgitava
três comprimidos ingeridos na tentativa de suicídio
empreendida quando pensava que ia morrer de tédio,
a célebre poeta formulou
lacônico depoimento
sobrevivo
lírica
inexistente
Andréa Catrópa (www.andreacatropa.com) nasceu em 1974. É doutora em Teoria Literária (USP) e ministra aulas e cursos nas áreas de literatura e criação de textos. Publicou o livro de poemas Mergulho às avessas (Lumme: 2008) e participa de coletâneas como Rock Book – Contos da era da guitarra (Editora Prumo:2011), Prévia poesia (risco editorial: 2010) e Antologia da Poesia Brasileira do Início do Terceiro Milênio (6 dias, 6 noites: 2008). Em 2014, concluiu sua primeira novela, ainda inédita, intitulada de Em Negativo. Foi coeditora, ao lado de Eduardo Lacerda, do Jornal de Literatura Contemporânea O Casulo. Realizou a série radiofônica Ondas Literárias, premiada pela Secretaria de Estado de Cultura. Recebeu a Bolsa de Criação Literária (PROAC) efoi duas vezes contemplada com o Rumos Itaú Cultural.