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e disse a realidade não muda - oito poemas de Hélio Neri

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scrennshot de uma rua




Frankenstein-Monstro

"há quem diga, que eu
não sou de nada
que eu não sei de nada
e não peço desculpas"
(Sérgio Sampaio)

transfigurações
da face, deslocamentos
recolocações, ora uma
aparência, ora outra,
torto, esquisito,
sem qualquer formato
padrão - adequado -
pernas, braços
e membros (extensões
atrofiadas)
raciocínio questionável
sonhos restritos
a vida vivida apenas na
antiplenitude da vida
sem sóis, sem
céus maravilhosos
desprovida de ações
memoráveis
sem grandes feitos
realizações
desde sempre
refeito, remendado
recosturado
não é o sonho de ninguém
de nada
"o coração era grande;
vivia quando nasceu"




HOMEM-MÁQUINA

para Donizete Galvão

um sono que pudesse
recuperar todos os
sonos atrasados
um cérebro capaz
de se concentrar em
ene coisas a um só tempo
uma energia capaz de
durar dias meses e anos
um corpo que continuasse
vivo jovem intacto
sem sofrer qualquer
ação do tempo
um coração que pudesse
suportar toda dor
tristeza ódio
e amor do universo
uma razão que pudesse
pôr fim a todos
os conflitos do mundo
um homem capaz
de superar toda
e qualquer máquina




nº. 118


eu sou
uma imagem
aqui
parado neste
ambiente
pessoas vão e vêm,
uma ou outra talvez
olhe para mim,
tal qual eu também,
mais adiante
(não muito), há os
das ruas (possivelmente
moradores), (ou conchas)
refletindo sempre
sobre algo
qualquer coisa
não importa –
nada é tão drástico
que já não se tenha visto
às vezes consterna
porém não muito
pode ser que estejamos
empedernidos (ou
então, apenas eu)
e tudo continua
de uma maneira
ou de outra:
embora nem tudo
faça sentido
eu continuo – também




I04 – Las Vegas / Capuava


o real
é sempre o real
: enfrentar todos
os dias, este sol a pino
- às sete da manhã –
ou as tempestades
que (vez por outra) desabam
estraçalhando tudo
nestas épocas,
as horas sempre suprimidas
e o tempo ultralongo
daqui até lá
e vice-versa
passar por quatro
ou cinco mundos diferentes
- como já disse
o poeta –
deparar, logo cedo, com os sonhos
e anseios de cada um
incrustrados em seus rostos,
o cotidiano e o peso
do mundo, redesenhando
(a cada instante) o semblante,
notar um pouco disso
também em você,
não que irá se sentir resignado
ou mais feliz por isso
ou porque são assim
as coisas –
mas porque é vida




PROPAGANDA


além da fachada
placas cartazes
o entorno
tudo muito bem
cuidado e puído
o que mais se
destacava: expressão
/ famoso prato de pedreiro




...


os carros de churros
os de pamonhas, suas
cantilenas, som estrídulo
e forte ocupando
implacável toda atmosfera
desobedecendo a lei
do tempo (como se
ele ainda não houvesse
passado), que os outros meios:
de comércio, de comunicação
que a rapidez, a eficiência,
ainda não se fizessem tão
necessárias, tão urgentes,
que estes eram como se
ainda não fizessem falta
nem sentido, que nada disso
impedisse a proliferação
de tantos outros,
os dos carros de peixes,
os de pães doces, os caminhões
e suas variedades de frutas,
variedades de queijos, outros
tornando tudo numa
imensa feira itinerante
que a tecnologia, informatização,
conforto dos shoppings,
o absoluto mundo das
modernidades, mordomias
tão imprescindíveis
e sonhadas, ainda não
fossem capazes de alterar
alguns típicos hábitos, que
toda transformação e
evolução do mundo lá fora,
não são ainda suficientes
para evitar que o mundo
aqui dentro continue
o mesmo




PRIMAVERA


não há mudança nas flores
no campo
comportamento
o céu continua assim
não há sombra
água fresca
não importa o que se tem feito
o coração não muda




13.


às vezes imagino
que somos todos Sísifo








Hélio Nerinasceu em Santo André (SP), em 1973, onde reside. Publicou os livros “Anomalia” (2007), “PalavraInsubordinada” (2011), Alpharrabio Edições. “Bandido” (2014), Oitava Rima Editora, “Anestesia” (2016), Editora Córrego. Integra o Sarau na Quebrada desde 2011.

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