Colagem, Frederico Martins 2008
Alegorias atadas à cama, Frederico Martins
Junto à cama. Ela. O mundo. Imóvel. Relógio. Inumeráveis ponteiros. Pousava os olhos em si mesma. Girava. Ela sabia como se enxergar, tatear, se ouvir e se dizer. Tinha pés. Dentes. Também mãos e cobertores. A Cama. Tornara-se imóvel. Zumbido. Noite. Luz. Cortina. Vento. Ponderava minuciosamente diversas ânsias de movimentos. Prematuros e ardentes gostos derretiam os lábios. Sentia-se. Saliva. Talvez movesse somente os dedos. Seios. Queria roçar, morder, unhar, gemer. Primeiro um dedo. Língua. Suor. Calor. Uma aranha tecia, lentamente, sua queda. Debaixo do travesseiro: Mosquitos. Unhas. Riscos. Carne. O mundo escoava; coçava. Muros pacatos. Espaços vazios. Hoje. Malícias. Já. Pimentas. Formigas. Agora. Pêlos. Queria aprender a morrer. Gozar era quase aprender. O Sangue. O Branco. Os Dentes. O Vermelho. Úlceras. Que importa este impulso se permaneço nesse momento? Pensou. Uma perna fugiu. Outra. Passos. Uma sombra se projetou na parede. Duas. Permaneceram. Jornal. Cadeira. Telefone. Cigarro. A aranha sabia dos pés mesmo sem tê-los. Atados. As teias. As veias. O Pulso. Eu. Matei e não me arrependi. Morri sorrindo. Lençóis. Mãos. Sua linda nuca. O ruído de dois corpos apodrecendo.