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4 poemas inéditos de Fernanda Fatureto

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Pequeno thriller  sobre a lembrança

“The city sun sets over me”
(PJ Harvey/Thom Yorke)

I

“O sol da cidade se põe sobre mim.
Eu não acho que nos veremos novamente”; ouço tocar
enquanto corpos estão entregues ao acaso:
Um descuido e a memória queima.
Nenhum aviso de que o laço se romperia.
Não há alarde para o abandono.
Desvencilhar de toda amarra que lhe traga aqui e agora.
Tentei um tiro no escuro;
Dali saiu feito sombra o outro lado do espelho.



II

Obscura paisagem de tempos mortos
Em que corpos pesam a eternidade
Por sobre lençóis manchados de choro.
Obscuro prazer de silenciar novas palavras
No vasto cume da noite.
Perpétua morada da solidão,
Companhia maculada pela indissolúvel espera
De qualquer gesto que lhe tateie a vida.



III

Não estaria tão claro o céu se fosse abril,
Mas é setembro mês da primavera
E as folhas sentenciam a chegada de algo mais límpido –
Dores e pequenas nuvens refazem a chuva
Que molha e insiste ainda não é o fim.
Ainda ressente o corpo,
Memória febril.
Aparam-se arestas e rechaçam a lembrança;
Apagam-se vestígios enquanto há dor
De imaginar as horas que escorrem
Feito ausência.
Toda ausência é ruína e escombro ante o esquecimento.



IV

Refaço caminhos longos,
O calor queima o corpo no leito obscuro da memória.
Murmúrio e martírio sobre o mesmo rosto
Refletido no espelho.
Tudo o que pesa adquire nova vida ao alvorecer.
Trilhas repetidas pelo ciclo infinito do tempo
Permanecem no centro do peito
Como tiro de canhão à meia noite –
Traço marcado para a morte e renascimento.



*Fernanda Fatureto (Uberaba, 1982) é poeta e jornalista.



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