a senhorita Salander se esgueira por meandros urbanos repisando
com botas de couro pretas poças de ácido clorídrico refletindo neon;
agora a senhorita Salander violenta sexualmente um advogado sádico,
já sexagenário, para vingar suas muitas vítimas de pedofilia e tortura;
ainda que um homem ame a senhorita que atende pela alcunha secreta de “vespa”
(da hacker sueca, punk, lésbica), a senhorita Salander tem sua própria agenda secreta;
o drama da infância da senhorita Salander inclui os estupros ininterruptos
de um agente duplo contra os quais, hoje, Lisbeth maneja sabres, adagas e berettas,
coleciona estacas de plástico, indetectáveis, de carbono, baionetas
com as quais perfura o coração de mil touros ruborizados pela culpa recuperada;
comemora com nicotina e absinto sua trágica predisposição
para atriz de operetas, para a definitiva diva da vendetta;
agora a senhorita frequenta antros de androginia,
contraindo os mesmos sintomas comatosos de Estocolmo;
a senhorita Salander também consome homens e quando dança,
sua tatuagem de dragão é uma flâmula incandescente que escapa da pele;
agora desaparecida, os homens que amam as mulheres anseiam por ela,
muito embora aqueles a quem ateou fogo (só para criar mansos
seus incêndios de estimação) com gasolina, o fósforo delicadamente riscado,
pálidos, se sintam ligeiramente mais seguros, trancafiados voluntariamente
em seus bunkers "ANTI-SALANDER";
ahh esta senhorita Salander é tão estranha, magnânima e justa
na exata medida do seu sadismo reativo, que desperta a admiração
do tal poeta, prestes a ser deliciosamente atacado por ela;
ficará entre a vida e a morte o pobre, um renascimento suspenso,
um idílio às avessas, um oásis cuja mancha polimórfica, de sangue,
e apenas o sangue derramado numa sexta-feira de agosto poderá
um dia, quem sabe, caso haja uma Lisbeth benévola, recuperar plenamente...
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