CINCO PARA O MEIO-DIA
São cinco para o meio-dia.
Há dez dias são cinco para o meio-dia.
Lembrei-me que tanto ao escutar uma narrativa em análise quanto ao narrar minha história a meu analista, em alguns instantes há nitidamente a sensação de um tempo que não passa, de algo como a obra de Salvador Dali na qual nos deparamos com relógios que se derretem diante da Persistência da lembrança. Tais experiências, mesmo expostas aos dias que se vão com o calendário, são capazes de serem ilusoriamente recuperadas com sensações extremamente vívidas. Em outros momentos, entretanto, prevalece o medo de que o tempo passe. Um medo de que a história se perca no tempo, uma necessidade de mantê-la, preservá-la, aprisioná-la. Percebo, mesmo que pelo avesso, que esses dois exemplos me levam à ideia de uma sensação duradoura, da possibilidade, quase perfeita, de um tempo estático.
Há dez dias são cinco para o meio-dia.
Há dez dias meu relógio parou e permaneceu em meu pulso para me mostrar que meu tempo é outro. E está parado. Ou ainda, escancarar meu desejo de capturar o instante (que já tornou-se outro) aprisionando a cena e o afeto.
Meu tempo é outro.
É quase-meio-dia. Estou quase-lá. Espero, afinal, faltam só cinco minutos.
...
São cinco para o meio-dia.