Quando saio pelas ruas nem imaginam
Que sou Arthur
Não o da Távola
Mas o mordomo de Deus, o Arthur
Bispo do Rosário
E que ainda só não tive coragem
De juntar meus cacarecos
E fazer meu manto
Mas já os olho
Como quem sabe
Muito bem
Quem entrará no meu céu
Saio empunhando sérios brinquedos
Que se quebram
Crio o amontoado de suas sucatas
São os carros, as gentes, as buzinas
São os inocentes deitados na rua que
Passam por cima dos meus fragmentos
E de novo eu choro
Para dentro
As vozes várias querem me convencer
Que está tudo bem certo
Mas por que é que não encontro
Na minha caixa de segredos
Um velho amuleto?
Arranco um a um meus fios de cabelo
E os colo em sete cabeças de boneca
Só assim de poder vê-las
Posso não me sentir calva
Saio na rua, careca
Pronta para trespassar o riso:
A espada, eu desenho na tábua.
Imagem: Broken doll by LadyShadowStyle
Adriane Garcia, nascida em 1973, é mineira, de Belo Horizonte, cidade onde vive e trabalha como funcionária pública. Cursou História na Universidade Federal de Minas Gerais e especializou-se em Arte-Educação pela UEMG. É teatro-educadora e atriz. Escreve poesia, contos e dramaturgia, além de infanto-juvenis. Venceu o Prêmio Helena Kolody, do Concurso Nacional de Literatura do Paraná, com o livro Fábulas para adulto perder o sono. Seu O nome do mundo, também de poesia, será publicado pela editora Armazém da Cultura.